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Artigo Científico Prof. Jonathas Moreira - PARTE 2
Por Vander Juliano Escudero (Professor), em 2016/05/22270 leram | 0 comentários | 73 gostam
PLASTICIDADE DO TRABALHO, POLÍTICAS PÚBLICAS E MOBILIDADE FORÇADA: um estudo com trabalhadores do Assent. Gleba XV de Novembro

Jonathas Moreira Silva
jonathas.moreira007@gmail.com

Orientador:
Fernando Mendonça Heck
fernandomheck@gmail.com
A persistência dos trabalhadores nos acampamentos, mesmo em meio à série de repressões das elites locais, bem como do judiciário e da mídia, conferiu a conquista do território. Que se deu do seguinte modo:
 
Nos meses de julho e agosto de 1984, os 446 trabalhadores rurais e suas famílias foram transferidos e assentados numa área de 13 310 hectares. Esta área, desapropriada para utilidade pública, pelo governo paulista, no município de Teodoro Sampaio, possibilitou a implantação do projeto de valorização das terras do Pontal: Gleba XV de Novembro e o fim do segundo momento do movimento social rural. O terceiro momento do movimento social da Gleba XV de Novembro se deu quando ocorreram as formas de organização da produção nos lotes rurais, após a divisão da gleba, em lotes para a lavoura e em lotes para a pecuária, foram elaborados os critérios de seleção dos beneficiários e o sorteio dos lotes (FERNANDES, 1993, p.3).

Essa divisão em lotes destinados a lavoura e a pecuária leiteira, não se configurou na prática, pois a grande maioria dos mesmos, destinam-se à pecuária leiteira atividade mais rentável economicamente. Mas, mesmo com a renda principal sendo proveniente do leite, observamos durante o trabalho de campo realizado em setembro de 2014, que em boa parte dos lotes visitados os assentados destinam um espaço para a agricultura com hortas de verduras e legumes que possuem um significado importante para a manutenção da família ou seja, boa parte dos alimentos consumidos mensalmente são provenientes do lote (Figura 3).

  Entrevista realizada no dia (13/09/2014) na casa do entrevistado, que está localizada no setor três da Gleba XV de Novembro.

Sendo assim, a conquista do território concretizou-se e toda uma série de novos desafios entram em cena, como a permanência na terra. Isso porque somente a posse da terra não garante que os assentados sobrevivam dos seus respectivos lotes, haja vista que para iniciar qualquer atividade agrícola se faz necessário recursos financeiros, e sem políticas públicas eficientes, voltadas a dar condições financeiras aos assentados criando-se sérias dificuldades para a permanência na terra. Conforme Bergamasco e Norder (1996, p.10):

Após a conquista da terra, inicia-se uma nova luta, agora pela consolidação da posse da terra, pela obtenção de condições econômicas e sociais mais favoráveis ao estabelecimento destes trabalhadores rurais enquanto produtores agrícolas.

Nesse sentido, percebemos que apenas a conquista do território não é suficiente para permanência na terra tendo por objeto de reprodução da vida somente o trabalho realizado nos lotes conquistados através da luta pela terra. Esse é um fenômeno que temos percebido no Assentamento Gleba XV de Novembro, pois percebe-se vários movimentos pendulares diários para o trabalho nas cidades, usinas de açúcar, entre outros na escala regional, todavia, há deslocamentos mais longos em escala interestadual que podem durar semanas e meses como nos casos do trabalho em obras do Programa de Aceleração do Cresicmento (PAC) do governo federal como em Jirau (RO) e para construção civil, sobretudo em Maringá (PR).
Procuraremos entender essa mobilidade espacial do trabalho à luz do prisma teórico da mobilidade forçada (GAUDEMAR, 1977; GEMELLI e CARVALHAL, 2011; PERPETUA, 2010) e do contexto da plasticidade do trabalho (THOMAZ JUNIOR, 2009), isto é, compreender analiticamente a mobilidade do trabalho como resultado da imposição do metabolismo social do capital e no caso específico dos assentamentos da ausência de políticas públicas efetivas, ou seja, de uma política agrária e agrícola permanente destinadas à agricultura camponesa (LEAL, 2013).
  A configuração da Gleba XV de Novembro ficou da seguinte forma: “Os 13 310 hectares da área total do Projeto Gleba XV de Novembro foram assim subdivididos: a) 8 000 hectares de terras para lavouras temporárias e perenes com lotes variando entre 15 a 18 ha., beneficiando 417 famílias; b) 2000 hectares de terras para pecuária leiteira como lotes de 40 ha., beneficiando 23 famílias. Foram reservados 70 lotes para futura expansão, mas já estão ocupados com pecuária leiteira; c) 3000 hectares destinados para reservas florestais, com áreas de Preservação, Recuperação Florestal e matas nativas e áreas para silvicultura, com eucaliptos” (FERNANDES, 1993, p.4).

Mobilidade forçada e plasticidade do trabalho no Assentamento Gleba XV de Novembro

A mobilidade dos homens e mulheres faz parte de toda a história da humanidade. No entanto, as condições para o deslocamento de um lugar para outro possuem características históricas possíveis de serem apreendidas. Segundo Perpetua(2010) no capitalismo a mobilidade assumiu uma centralidade e importância muito maior do que nos modos de produção pretéritos.
Em decorrência, a mobilidade espacial do trabalho no capitalismo consiste num processo imposto historicamente absolutamente necessário para a reprodução do capital configurando-se em mobilidade forçada onde existe a necessidade objetiva de venda da força de trabalho por parte dos trabalhadores com vistas a garantir sua sobrevivência. Isto é, os trabalhadores não são livres para si mesmos, mas sua liberdade é circunscrita aos limites impostos pela sociedade do capital. Segundo Gaudemar (1977):

Ainda a respeito das características da força de trabalho, reitera-se que a mobilização para o trabalho, só é possível porque no capitalismo o trabalhador é livre. Como apontou Marx, o trabalhador dispõe apenas de sua força de trabalho enquanto mercadoria e não tendo outra mercadoria para vender, sendo livre de tudo, por meio da venda de sua força de trabalho o dinheiro se transforma em capital. Destaca-se, além disso, que o trabalhador é livre para o capital, assim sua liberdade é condicionada aos interesses do processo de produção capitalista, de modo que, durante o processo produtivo, por exemplo, o trabalhador não tem liberdade alguma, sendo que, em alguns casos, a não liberdade do trabalho não está condicionada apenas ao momento em que o trabalhador está desenvolvendo suas funções produtivas, de modo que os anseios do capital podem ditar as regras dentro e fora do ambiente do trabalho (GAUDEMAR, 1977, p.189-190).

  Aqui fazemos referência à obra do filósofo marxista István Mészáros quando argumenta que o metabolismo social do capital é um produto histórico e por esse motivo a sociedade de classes capitalista possui limites históricos não tratando-se de um modo de produção eterno e imutável. Cf. MÉSZÁROS, 2002

 Embora Gaudemar (1977) esteja se referenciando à mobilidade forçada do proletariado clássico em Marx, percebemos que esse processo também ocorre com os camponeses com algumas características específicas que inclusive trazem desafios teóricos para a compreensão do trabalho e da classe trabalhadora no século XXI.
Por isso, optamos em aprofundar a análise com o conceito de plasticidade do trabalho (THOMAZ JUNIOR, 2009), isto é, buscando compreender os processos que fazem o camponês-assentado migrar em busca de trabalho assalariando-se em obras do PAC, construção civil, corte de cana-de-açúcar, bem como, outras formas de inserção no trabalho assalariado.
Segundo Thomaz Junior (2009) a plasticidade do trabalho é constantemente redesenhada e percebê-la é absolutamente fundamental para o entendimento da classe trabalhadora na contemporaneidade. O autor constatou em suas pesquisas, utilizando-se, por exemplo, do estudo de caso do trabalho no setor canavieiro esse movimento que conceituou de plasticidade do trabalho. Ele percebeu que os trabalhadores proletários agrícolas nas frentes de corte manual possuem distintas trajetórias e identidades, pois, no mesmo ambiente laboral coexistiam assentados de reforma agrária e migrantes nordestinos vivenciando a condição de trabalho assalariado. Isso significava, para o caso dos assentados, que os mesmos vivenciavam num mesmo dia a condição de camponês e proletário, um movimento quase nunca percebido e, por conseguinte negado pela teoria e que fundamenta o conceito de plasticidade do trabalho. Segundo o autor:
Deixar de ser camponês e vivenciar o universo clássico do trabalhador proletário, com ou sem vínculos formais, ou externalizando, no limite, a plasticidade do trabalho constantemente redesenhada, podendo então, participar das inúmeras formas de subordinação e de dominação às relações hegemônicas capitalistas, é um aspecto da realidade do trabalho a ser considerado nas nossas pesquisas, sob pena de negligenciarmos sua própria existência diferenciada e contraditória, na sociedade do capital (THOMAZ JUNIOR, 2009, p.223).

Todas essas formas de inserção laboral fora da atividade no assentamento, sem que o camponês perca sua condição de existência no assentamento que fundamentam a plasticidade do trabalho no constante redesenhar, também se relaciona à mobilidade forçada.
Nesse sentido, na pesquisa procuramos entender através da trajetória dos assentados na Gleba XV de Novembro a mobilidade forçada pela condição precária de manutenção no campo, desassistido por uma efetiva política pública agrícola que configura num dos aspectos do movimento da plasticidade do trabalho. Segundo Medeiros e Esterci (1994):

Parece ser possível constatar uma precariedade material nos assentamentos, resultado, [...], da carência de investimentos efetivos por parte de Estado no sentido de dotá-los não só de um mínimo de infra-estrutura, mas também proporcionar-lhes recursos para plantio, comercialização, assistência técnica etc. [...] A essa precariedade, os assentados respondem buscando alternativas que lhes permitam a sobrevivência, mas mantendo-se de posse da terra (MEDEIROS e ESTERCI, 1994, p. 24).

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