O ARAUTO DO VALE
Jornal do Médio Vale do Paranapanema
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Dons questionáveis
Por Eleutério Gouveia Sousa (Leitor do Jornal), em 2023/02/0481 leram | 0 comentários | 86 gostam
Aceitam quem quer, ou uma consulta psiquiátrica?


         Décimo: Visto e provado que o Perdão é um acto-contracto bilateral entre agressor e agredido, entre devedor e credor, que lugar ocupa Deus neste binómio? À primeira vista, parece que nenhum, mas à profundidade, Deus ocupa o espaço todo. Porquê?

Consultemos, de novo, o LIVRO e leiamos o evangelista Mateus, capítulo 25, versículos 31 e sgs.: Tudo o que fizestes a um dos mais pequeninos foi a Mim mesmo que o fizestes. E tudo o que deixaste de fazer a um dos mais pequeninos foi a Mim mesmo que o deixastes de fazer. O nosso Mestre precisou bem o objecto do serviço ou da doação: não foram promessas, velas, incensos, missas, procissões ou confissões, mas soluções concretas para problemas concretos: Pão para a fome, Água para a sede, Abrigo para o abandono sem refúgio, Visita a um doente, a um preso.

Além da objectivação da matéria de facto, o mais profundo e retumbante (e que faz de Jesus o Maior Líder Religioso da História) é verificar a portentosa identificação da Divindade com a Humanidade. Em nenhuma outra Religião se instaurou este princípio basilar: Deus (‘re)-incarnado’ na pessoa humana, por mais insignificante ou indefesa que pareça. Tão decisivo este princípio, que até está na base de todo o ordenamento jurídico-penal do cristianismo!!! Por outras palavras: é por ele que seremos julgados: Tudo o que fizestes a um dos mais pequeninos foia Mim que o fizestes.

Precisamente neste entroncamento é que se situa o elemento religioso: só ofendemos a Deus quando ofendemos ou prejudicamos alguém. Se o “agravo” a Deus passa pelo “agravo” feito a alguém, na mesma lógica, o Perdão de Deus só acontece através do Perdão desse alguém. Portanto, é este Perdão humano que tem a precedência sobre o Perdão religioso. Infelizmente, por cobardia, têm-nos ensinado o contrário: pretendemos chegar a Deus sem passar pela pessoa humana. Inútil, abusivo, farisaico! Primeiro, vai lá fora falar com quem ofendeste e, só depois, vem ao altar.

Trago agora à colação, os 150 confessionários e o eufemístico ‘Parque do Perdão’ da JMJ. Por hipótese, uma alma cheia de escrúpulos e bem intencionada vai confessar-se num deles e ficar ainda com algum remorso de não ter-se confessado correctamente. E passa para outro e deste para um terceiro e um quarto, até chegar ao último do 150 confessionários, mas ainda carente, duvidando do perdão do confessor. E tem toda a razão: os erros, os roubos, as calúnias, as agressões que confessou a um estranho (ou aos 150) foram entregues a destinatários errados, desconhecidos, talvez de outras nacionalidades. O destinatário certo, o lesado ou agredido, é aquele ou é aquela que o agressor conhece bem e, possivelmente, vive perto da sua casa ou dentro dela. Nestes termos (e sem menosprezo por quem procura no confessionário uma espécie de catarse psicológica) é legítimo concluir que o apregoado “Parque do Perdão” não mora na Bobadela da JMJ.

E agora, a resposta à tal ‘frase batida’: A quem se confessa Putin?... Ele é cristão e ortodoxo. A quem se confessa?... A essa ‘múmia’ extra-terrestre, de nome Kirilos, Patriarca de Moscovo, auto-proclamado Representante de Cristo na terra… e seu antigo camarada do KGB!... Quem é que atura tão ridícula e blasfema comédia orto-religiosa?! E as famílias que ele sangra de dor em campo de guerra, os mortos em combate, a destruição de cidades e comunidades, as crianças atiradas ao abandono, à fome, aos escombros?... Putin, o assassino, também se confessa e comunga… Só por isto, sobram razões para descre de uma farsa chamada confissão!

    Peço desculpa a quem teve a paciência de acompanhar-me nesta íntima introspecção aprendida ao longo da vida, peço também desculpa se ofendi a mentalidade e a sensibilidade de quem pensa o contrário, Pretendi apenas justificar por que é que eu, nos 60 anos de ordenado padre católico, não ouço confissões há mais de 50, celebrando em seu lugar a “Festa do Perdão”, um acto comunitário no templo da Ribeira Seca, previamente preparado, consoante a expressão de um velho paroquiano, já falecido, que dizia: ‘O Perdão é como o pão, tem que se trazer de casa, amassado e cozido”.

Festa do Perdão, sublinho – porque o Perdão Perfeito há-de terminar em festa – a Festa do Abraço, da Paz, da Fraternidade!

 

03.Fev.23

Martins Júnior


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